Denuncias contra prefeito de Uruburetama podem não ter validade na Justiça

As denúncias por parte das vítimas que se dizem abusadas sexualmente pelo médico e prefeito afastado da atual gestão da cidade de Uruburetama, José Hilson de Paiva, podem de nada valer para a Justiça. Até setembro de 2018, o Código Penal Brasileiro determinava que as vítimas de crimes sexuais deveriam se manifestar no prazo máximo de seis meses. Depois do último mês de setembro, a regra deixou de existir, mas permaneceu sendo válida para os crimes ocorridos antes da mudança.

Os vídeos que flagram José Hilson abusando das pacientes dentro do seu consultório são de datas anteriores a este prazo da decadência valer. Segundo uma fonte ligada ao Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), a busca agora é por mulheres que tenham sido vítimas recentemente do médico, para que assim o órgão acusatório possa, do ponto de vista legal, dar prosseguimento à ação contra o médico a partir dos novos fatos.

A defesa de Paiva, representada pelo advogado Leandro Vasques, alega que precisa coletar todos os elementos investigativos que estão em curso. Na fala do advogado, ele adianta que quando comparadas a fisionomia atual do prefeito com a fisionomia de quando os vídeos foram filmados, é percebido que muito tempo já se passou.

“Tecnicamente falando, ninguém defende crime, defende a aplicação do bom direito. Eu ousaria afirmar que os fatos constantes do vídeo já foram sufocados pelo tempo, como se fosse uma espécie de prescrição. Ninguém aqui está querendo justificar o injustificável. O que nos resta é apurar o que de fato tem motivado isso”, afirmou Leandro Vasques se referindo aos fatos só terem sido divulgados ao público agora devido a motivações políticas envolvendo Artur Wagner Vasconcelos Nery, vice-prefeito de Uruburetama que assumiu a gestão no início desta semana quando Paiva foi afastado por decisão da Câmara Municipal de Uruburetama.

O presidente da Comissão de Segurança Pública da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção Ceará (OAB-CE), Deodato Ramalho, destaca que a lei não retroage a fim de culpar pessoas, e então os casos antigos acabam por prescrever. Porém, Ramalho adianta que há possibilidades para condenar o médico pelos crimes antigos com base em interpretações judiciais.

Regra geral

O advogado da defesa garante que os vídeos com cenas de crimes sexuais divulgados pelo Sistema Verdes Mares não aconteceram durante o tempo em que Paiva estava como prefeito de Uruburetama. Vasques acrescenta que ontem foi enviado documento ao MPCE e Poder Judiciário colocando o médico à disposição para prestar qualquer esclarecimento. Também foi solicitado acesso integral às imagens.

Depoimento

“Até então, ele não foi notificado para prestar nenhum depoimento. Ele não foi chamado para ser ouvido e nem sequer para afirmar se tem algum desvio comportamental, alguma perturbação mental… Acredito que estes crimes de componente sexual já foram alcançados pelo instituto da decadência, portanto já está extinta a punibilidade com relação a isso”, informou Leandro, dizendo respeitar que as instituições devam pesquisar as datas exatas em que os crimes aconteceram.

Deodato explica que, se uma mulher só tiver se percebido como vítima agora, após a ampla revelação de outros casos, isto pode significar uma “brecha na lei”. “O caso pode ter acontecido anteriormente, mas se a vítima só tiver se dado conta agora do crime, porque achava que os procedimentos do atendimento médico eram normais, ela pode sustentar isto. É uma coisa com certa dificuldade de se comprovar, mas é levado em consideração, por exemplo, se é uma vítima da zona rural e com maior dificuldade de compreender estas questões”, pontuou o presidente da Comissão.

Ainda segundo Deodato Ramalho, outra possibilidade para a Justiça desprezar o prazo limite de seis meses é se houver casos com indícios de violência real, como exemplo situações em que José Hilson tenha agarrado à força suas pacientes e as privado de liberdade. Deodato ressalta que o abuso mediante fraude – com o médico alegando que os crimes eram realizados dentro da normalidade e os tratamentos indispensáveis para as pacientes – também pode ser considerado pelo poder judicial.

Diário do Nordeste

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