Ceará tem mais mortes por Covid-19 que 141 países do mundo

Não é nenhuma novidade que o Ceará figure entre os estados do Brasil com o maior número de óbitos em decorrência da Covid-19 – a doença provocada pelo novo coronavírus. Atualmente, está em terceiro neste cálculo, perdendo apenas para os registros em São Paulo (3.743) e Rio de Janeiro (1.770). Mas os cearenses não têm só essa conta para fazer. Isso porque, de acordo com dados da universidade estadunidense Johns Hopkins, que mapeia, em tempo real o número de casos confirmados e óbitos pela doença ao redor do globo, o Ceará está à frente também de 141 países do mundo neste quesito. Estão considerados nessa análise locais onde a pandemia já está em declínio; onde ela acabou de começar; ou que têm curva epidemiológica parecida com a do Estado.

Até as 10h desta terça-feira (12), o Ceará somava 1.228 óbitos em razão do novo vírus, sem contar as mortes suspeitas, cuja testagem foi realizada para possível confirmação da doença. As informações regionais constam na última atualização da plataforma IntegraSUS, da Secretaria da Saúde do Estado (Sesa).

Em número de casos fatais, o Ceará está à frente de países com populações maiores que a sua e que fazem fronteira com outras nações já castigadas pela pandemia da Covid-19 neste ano, como é o caso de Portugal. Na Europa, os portugueses dividem limites com a Espanha e o Oceano Atlântico. Porém, enquanto 26,6 mil espanhóis morreram por causa do coronavírus, em Portugal foram 1.144 até essa segunda-feira, conforme a Johns Hopkins.

Quando comparado a um país vizinho ao Brasil, só o Ceará já registrou quase quatro vezes o número de mortes totais da Argentina. Até essa segunda, 305 argentinos faleceram em razão da infecção viral. Considera-se, entretanto, que a população argentina é quase cinco vezes maior do que a cearense. O que confere ao país latinoamericano uma taxa de mortalidade significativamente inferior.

Dos cinco países mais populosos do mundo, os cearenses apresentam maior índice de óbitos do que dois deles: Paquistão (667 mortes com população de 212,2 milhões) e Indonésia (991 óbitos, com população de 267,7 milhões). Ambos estão na Ásia, continente que apresentou o primeiro registro da Covid-19. Os dois países, atualmente, estão passando por um aumento no número de casos e mortes, o que pode indicar o crescimento da infecção.

Comparativo

De acordo com o epidemiologista Luciano Pamplona, professor da Universidade Federal do Ceará (UFC), se já é “muito difícil” comparar a situação da Covid-19 no Ceará e nos demais estados do Brasil, mais complexo ainda é tecer semelhanças com outros países do mundo.

Contudo, para o especialista, a leitura é clara: “a gente está pior do que os outros países porque, de fato, a nossa situação é muito grave. O país que tem mais ou menos óbitos neste momento está ligado à informação ser divulgada, à condição de investigação desses óbitos e ao acesso ao tratamento”, exemplifica.17.599 casos da doençaAté ontem (11), o número de testagens positivas para o novo coronavírus já somava 17.599 registros em todo o Ceará. Fortaleza, por sua vez, continua como o epicentro do Estado, contabilizando 11.935 confirmações.

Para Luciano Pamplona, o fato que reforça a situação grave é o decreto de lockdown (bloqueio total) – também chamado de “isolamento social rígido” – em Fortaleza até o dia 20 de maio. Decisão que, no seu ponto de vista, foi acertada e tomada no momento certo. “Nenhum governador em sã consciência, sabendo do impacto econômico que isso tem, faria isso se não soubesse o quão grave é (a situação epidemiológica)”, diz, ao atentar para a disseminação da infecção pela periferia e pelo interior cearense.

Conforme o epidemiologista, “se você vai na periferia, ainda hoje tem gente que não acredita que existe coronavírus, que essa doença é besteira, que não precisa usar máscara. É completamente diferente desses países da Europa e da Ásia, em que há uma educação muito melhor do que a nossa, e as pessoas desde muito cedo entenderam que precisavam usar máscara”, sugere, evidenciando aspectos culturais e educacionais das populações continentais, que têm impacto direto.

Ausência

O mundo não está preparado para uma pandemia global de um vírus respiratório. A afirmação foi dada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) quando a Covid-19 ainda estava limitada a territórios chineses, em janeiro deste ano. Nesta época, ainda não sabíamos o nome da doença e nem a nomenclatura do Sars-CoV-2.

Do dia 31 de dezembro de 2019, quando houve a primeira notificação em Wuhan, na China, até às 20h dessa segunda-feira (11), já eram 4.165.752 casos confirmados ao redor do globo, em todos os continentes, dos quais 285.307 evoluíram para óbito, conforme o mapa mundial da Universidade Johns Hopkins.

“Se imaginar que, em Nova York, que fica no país mais rico do mundo, faltou médico, faltou respirador, faltou leito, não preciso dizer mais nada… Vai faltar em todo canto. Nenhum país tem 2 mil leitos de UTI guardados e disponíveis para a hora que quiser usar, isso não existe. A gente está vivendo uma situação absolutamente fora do parâmetro que a gente tinha”, atesta Luciano Pamplona.

Quem vive

O publicitário Mardônio Andrade, 33, se mudou para Buenos Aires ainda em fevereiro deste ano, antes de a Argentina confirmar o seu primeiro caso da Covid-19, registrado em 3 de março. Ele mora com a esposa que estuda medicina na capital argentina e iniciou as atividades no país latino em um curso de espanhol, a fim de se familiarizar com a língua local. Contudo, as aulas presenciais não foram mais do que duas.

Com as medidas restritivas – endurecidas pelo Ministério da Saúde argentino a cada semana que passava – as aulas passaram a ser virtuais e o publicitário viu sua quarentena chegar, de fato, aos 40 dias. “As medidas são fundamentais e muito necessárias e com os números você consegue perceber o quanto isso é eficaz. Eu sou totalmente a favor, neste momento, pois os números falam por si só como deram certo”, acredita Mardônio.

De acordo com o publicitário, pelo que consegue observar nas ruas e na mídia local, as pessoas aderiram ao isolamento social decretado pelo governo, com punição para quem desobedecesse as regras. “As pessoas realmente estavam respeitando. Logo no começo, quando ia pro supermercado, teve a loucura inicial, todo mundo comprando as coisas, mas, depois que rolou isso, quando fui novamente, todo mundo tinha que ficar de fora, com um metro de distância, e as pessoas respeitavam. Foi uma das coisas que me surpreenderam aqui”, narra Mardônio.

Diário do Nordeste

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